sábado, 27 de abril de 2013

DAISETZ SUZUKI



Carl Gustav Jung escreveu:

‘’As obras do Dr. Daisetz Teitaro Suzuki sobre o zen-budismo estão entre as melhores contribuições para o conhecimento do budismo vivo… Não podemos ser suficientemente gratos ao autor, primeiro pelo fato de ter trazido o zen para mais perto da compreensão ocidental, e segundo pela maneira como realizou essa tarefa.’’




(...)






Post Scriptum

Revista Nures nº 10 – Setembro/Dezembro 2008 – http

://www.pucsp.br/revistanures

http://www.pucsp.br/nures/revista10/Nures10_eduardo.pdf



Núcleo de Estudos Religião e Sociedade – Pontifícia

Universidade Católica – SP ISSN 1981-156X



Introdução



Este artigo trata de alguns aspectos presentes nos

escritos do japonês Daisetz

Teitaro Suzuki (1870-1966) que escreveu sobre o Zen

Budismo. Lynn White Jr., nos

inícios dos anos sessenta, comparou o impacto no Oc

idente dos

Essays in Zen

Buddhism",

de D. T. Suzuki, publicados em 1927, com as traduç

ões latinas de Aristóteles

feitas no século XIII ou as de Platão, no século XV

(White Jr., 1963, p. 299). Exageros à

parte, o autor apontava a importância de Suzuki, qu

e com seus escritos, retirou o budismo,

pela primeira vez, do confinamento dos estudos erud

itos e acadêmicos no século XIX, e o

levava para um público amplo, que neles se inspirou

para transformar, protestar,

reformular seus padrões existenciais. Entre os auto

res japoneses, ele se distingue por

escrever em inglês, para o público ocidental. Na d

écada de noventa, voltou à cena por

sua identificação por com a Escola de Quioto (Sharf

, 1995, p. 116-131).

Margareth Dornish divide a vida intelectual de Suzu

ki em três fases: uma primeira,

a de preparação, ocorrida na última década do sécul

o XIX e que vai até a Segunda Guerra

Mundial; a segunda, durante a Guerra e a terceira,

a partir de 1949, marcada por intensa

divulgação de suas idéias (Dornish, 1970, p. 149).

Poucos trabalhos analisam a obra de

Suzuki, a maioria são artigos, ressaltando algum tó

pico (Farkas, 1966; Merton, 1972, p.

58-64; Sakamoto, 1978, p. 33-42; Smith, 1972, p. 13

9-141; Smith, 1977, p. 141-154;

Shôjun, 198, p. 132-16).

Daisetz Teitaro Suzuki nasceu em 1870. Estudou na

Universidade Imperial de

Tóquio. Praticou o budismo sob a direção do famoso

mestre Soyen Shaku, abade dos

mosteiros de Engaku-ji e Kencho-ji, de Kamakura, e

que se destacou na modernização do

Zen budismo japonês. Em 1896, Suzuki passou por uma

intensa experiência religiosa (o

satori

), e nesse mesmo ano, acompanhou seu mestre a Chica

go, no Congresso Mundial

das Religiões, cidade que permaneceu, trabalhando e

m traduções (Shaku, 1971; Emyo,

1973) para o inglês e para o japonês, então escreve

ndo

Outlines of Mahayana Buddhism

.

Retornando ao Japão, em 1920, Suzuki, foi contratad

o como professor na

Universidade Otani de Kyoto, onde permaneceu até a

aposentadoria. Em 1921, iniciou a

edição de uma revista,

The Eastern Buddhist

, dedicada a estudos de erudição budista,

reformulada em 1962 e que continua a ser editada

Em 1933, Suzuki doutorou-se em literatura pela Univ

ersidade de Otani. Os seus

livros mais conhecidos foram publicados em inglês,

num período de aproximadamente

vinte anos:

Essays in Zen Buddhism, First Series

(1930);

Studies in the Lankavatara

Sutra

(1930);

Essays in Zen Budhism, Second Series

(1934);

Introduction to Zen

Buddhism

(1934);

Manual of Zen Buddhism

(1935);

Zen Buddhism and Its Influence on

Japanese Culture

(1938). Antes da guerra, falece sua esposa Beatric

e Lane, autora de

Mahayana Buddhism

(Humphrey, 1961, 10)

.

Em 1949, Suzuki publicou

The Zen

Doctrine of No-Mind

. Em 1957, publicou

Misticism: Christian and Buddhist

. Com 86

anos, foi ao México num simpósio sobre Zen e psican

álise, e algumas conferências foram

depois reunidas em livro por Erich Fromm.

Sua obra era pouco conhecida antes da Segunda Guerr

a Mundial, exceto por um

círculo restrito de eruditos, mas, depois desta, se

transformou na via de acesso ao

budismo Zen mais conhecida no Ocidente. Parte da po

pularidade de seus escritos advém

da sua descoberta pela

Beat Generation

, ocorrida na década de cinqüenta (Peçanha,

1988,45). Na década seguinte, sua leitura foi reto

mada pelos

hippies

e pelos teóricos da

contracultura. (Prebisch,1978, 162-164; Needleman,

1975,46). Outro grupo de leitores foi

constituído por intelectuais do porte de Martin Hei

degger

1

e Carl Gustav Jung que

escreveu o prefácio de

Introdução ao

Zen Budismo

(Suzuki, 1961, 5-27; Jung, 1980,60-

81). Muitos se inspiraram em seus escritos para re

fletir sobre o Zen budismo, como Alan

Watts (Watts, 1961, 12) e Christmas Humphrey (1975,

30). Seus livros repercutem

também em leitores brasileiros, como Ernani Barroso

(s.d.,9) e Nelson Coelho (1978,17).

A experiência

Neste artigo, privilegiamos os trabalhos escritos d

iretamente para os ocidentais.

Identificamos, como principais categorias explicati

vas que Suzuki se vale para expor suas

idéias aos ocidentais, as de

"

experiência religiosa

"

e

"

história

".

Tudo indica que o conceito de experiência religios

a tenha sido absorvido por

Suzuki de

As Variedades da Experiência Religiosa

, publicado em 1902 por William

James, que entendia a religião como um fato psicoló

gico e refutava que fosse uma doença.

James mostrava que a experiência religiosa era extr

emamente comum em sua época, uma

saída dos estreitos limites que a ciência pretendia

encerrar um mundo rico e complexo

(James, 1963, 493-4).

Suzuki leu William James e em muitas ocasiões, cit

a-o (Suzuki, 1956, 536 e 581)

e emprega a noção de “experiência” em vários moment

os. Inicialmente, considera que

tudo

é fruto da experiência (Suzuki, 1978, 133), pelo q

ue “Quando (o Zen) fala da

experiência pessoal, isso quer dizer abordar o fato

de primeira mão e não por um

intermediário, qualquer que possa ser.... Do mesmo

modo que a Natureza tem horror do

vazio, o Zen tem horror de tudo o que pode se apre

sentar entre o fato e nós mesmos. De

acordo com o Zen, não há ponto de apoio no fato el

e mesmo, combate entre o finito e o

infinito, a carne e o espírito” (Suzuki, 1976, 47).

A experiência responde às indagações sobre o sentid

o da vida, desafiada pela

insatisfação. Ela propicia a descoberta da plenitud

e, através da aquisição de um novo

ponto de vista, o

satori,

a Iluminação (sânscrito:

anutara-samyak-sambodhi

). Sem

satori

,

para Suzuki, não haveria o Zen: "Sustento... que a

vida do Zen começa com a abertura do

satori

(chinês:

kai ou

)" (Suzuki, 1965, 19 e 21). O

satori

fornece a união das oposições e

contradições num todo orgânico e harmonioso, recria

ndo o indivíduo (Idem, 292-3).

Ora, ao se apoiar no conceito de experiência religi

osa, Suzuki apropria-se de uma

construção mental elaborada por autores ocidentais,

e dela se valendo em múltiplas

dimensões. Serve, ao mesmo tempo, para apresentar o

budismo numa linguagem familiar

aos ocidentais, e também para indicar aos japoneses

a possibilidade de modernizar os

discursos budistas com um instrumento advindo dos p

róprios ocidentais, promotores da

modernização no mundo contemporâneo. Era válido par

a confirmar a perenidade e a

defesa dos valores budistas, ante os mesmos ocident

ais. E, afinal, também era um

instrumento intelectual de proteção contra a desqua

lificação do budismo feita por alguns

pensadores ocidentais.

Desse modo, muito textos dos

Ensaios

contêm argumentos que fazem pensar

serem respostas do pensador budista japonês ao filó

sofo francês Henri Bergson, autor de

Les deux sources de la morale et de la religion

, (Bergson, 1950, 980-1250), já que

Suzuki não o desconhecia. (Dilworth, 1985,95). Nes

te livro, Bergson

divide as formas

religiosas em estáticas e dinâmicas, e nestas últim

as enquadra o budismo, apontando, por

um lado, o papel relevante da Iluminação, mas, por

outro lado, considerando-o uma

religiosidade inconclusa, porque não teria ação, cr

iação, amor (Bergson, 1950, 1164).

Ora, Suzuki retoma e contesta Bergson que afirmara

que a ioga induziria a estados

comparáveis à hipnose (Suzuki, 1956, 32). Como o Ze

n se vale de treinamentos

semelhantes aos da ioga, Suzuki rejeita a afirmação

bergsoniana considerando-a nada

explicar: “Alguns seres acreditam que é científico

dar a certos fenômenos um termo que

vem a ser posto em moda, e ficam satisfeitos como s

e eles servissem de uma maneira que

ilumina seu entendimento" (Suzuki, 1965, 38-9).

A história

A segunda categoria que identificamos na argumenta

ção de Suzuki é a história.

Discordamos da conclusão de Margareth Dornish que S

uzuki desprezava a história

(1970,54). Nas obras que Suzuki escreveu para os o

cidentais, ele revela um

extraordinário interesse e preocupação com a histór

ia, ora entendida como uma forma de

consciência, ora como prática científica. De maneir

a original, Suzuki congrega história e

experiência religiosa, quando afirma: "O que os mod

ernos estudiosos do Zen têm a fazer

é um exame completo da própria experiência Zen e da

s formas pelas quais se manifestou

na História" (Suzuki, 1978, 130).

O conceito de experiência religiosa é central no s

istema de Suzuki, permitindo-lhe

compreender a razão de ser da religião em geral e,

particularmente, o budismo.

Continuando o debate com Bérgson, observa que "Cada

religião tem por fundamento a

experiência mística. Sem ela, todas as suas superes

truturas metafísicas ou teológicas

desmoronam-se..... A maneira de integrar a experiên

cia torna-se, assim, freqüentemente,

a causa das perseguições as menos religiosas ou, de

guerras as mais sangrentas. Qualquer

que seja a experiência religiosa permanece sempre a

energia que sustenta e dirige o

sistema metafísico. Isso explica a diversidade de i

nterpretações intelectuais mesmo no

interior somente do corpo do budismo, o Zen aqui e

o Jodô acolá, enquanto que a

experiência, do ponto de vista psicológico, permane

ce fundamentalmente a mesma"

(Suzuki, 1957, 724).



 Deste modo, toda religião com uma longa história,

é uma somatória de

experiências, e o que os discípulos do fundador exp

licam é a

visão que dele possuem

.

Para Suzuki, este fenômeno seria universal, ocorren

do inclusive no cristianismo (Suzuki,

1965,59). O budismo seria constituído por todas as

experiências e especulações dos

discípulos do Buda e, em particular, as sobre a per

sonalidade de seu mestre e suas

conexões com a própria doutrina. Desse modo, o budi

smo seria uma construção histórica

porque não surgiu “acabado” do Buda. É preciso lev

ar em conta o crescimento da

doutrina: “Na medida em que o budismo é uma religiã

o viva, e não uma múmia histórica

recheada de materiais mortos e destituídos de utili

dade deve ser capaz de absorver e de

assimilar tudo o que vem em ajuda de seu cresciment

o. Isso é o que há de mais natural

para não importa que organismo dotado de vida. E es

sa vida pode ser discernida sob

formas e interpretações divergentes" (Idem, 60-61).

Estas afirmações de Suzuki podem ser compreendidas

como contraponto aos

estudiosos ocidentais que afirmavam ser a modalidad

e Mahayana, predominante na

China, Coréia e Japão, uma degenerescência do budis

mo pregado pelo próprio Buda.

Essa avaliação ocidental era ditada pela ótica posi

tivista da religião, predominante nos

finais do século XIX e reproduzida muitas vezes em

nosso século.

2

Para tais pensadores,

só os discursos contidos no Cânon Pâli representari

am o verdadeiro ensinamento de Buda

porque seus sermões exporiam um ascetismo moralista

e filosófico, que ajudaria a

resolver as oposições entre suas concepções cientif

icas e a religião. Os mitos, o

maravilhoso, o ritualismo, a devoção etc., eram tid

os como degenerescência

supersticiosa.. A posição de Suzuki é de defesa do

budismo Mahayana, especialmente do

budismo japonês. Aceitar a avaliação ocidental seri

a concordar que o budismo de seu país

era decadente, algo despropósito no contexto histór

ico japonês de crescimento econômico

e imperialismo.

Entretanto, se a reflexão de Suzuki é defensiva, n

ão quer dizer adesão passiva à

tradição budista, e apóia o julgamento crítico para

um budismo moderno (Suzuki, 1965,

68-9). A crítica se funda na compreensão dos elemen

tos formadores de toda religião com

uma longa história. Neste exercício, é primordial s

eparar a figura do fundador do seu

ensino, porque é a personalidade do fundador que de

termina seu ensinamento. O

fundador não tinha consciência nem de seu ensino e

nem que criava um sistema religioso

novo. Ademais, os discípulos do fundador, enquanto

ele era vivo, não separavam sua

personalidade do seu ensinamento. Somente após a mo

rte dele é que sua personalidade

passa a ser o núcleo central do próprio ensino: "fi

zeram de tal modo que essa

personalidade servia para explicar o sentido desse

ensinamento" (Idem, p.53).

Há indagações formuladas por Suzuki indicando que p

ensava numa espécie de

programa para os budistas contemporâneos e partidár

ios do progresso, como: o que

constitui a essência do budismo? Como conceber o Bu

da? Qual é a natureza constituinte

do Buda? O ensinamento de Buda explicaria a vida do

budismo e sua evolução na

história? Haveria no ensinamento oral de Buda, algo

que lhe dava vida e persistia como

substrato, caracterizando a história do budismo atr

avés da Ásia? (Idem, 60)

Tal programa lhe proporciona repensar o budismo na

contemporaneidade e, ao

mesmo tempo, defender o budismo japonês das crítica

s ocidentais do século dezenove.

Devido o processo de mudanças históricas ocorridas

no Japão a partir de meados do

século XIX, idéias ocidentais ajudaram na crítica v

iolenta ao budismo, por parte dos

adeptos da modernização do país. Isto se manifesta

na reação xintoísta e nacionalista que

descartava toda doutrina religiosa estrangeira, inc

lusive a do budismo, apesar de estar no

Japão por quase mil e duzentos anos! Deste modo, o

budismo japonês era atacado no

estrangeiro e dentro do país. Suzuki o defende, por

tanto, num momento crucial (Kiyota,

1984, 251-59; Moore, 1975,271-365; Siefert, 1968, 8

6-132; Vié, 1982). E vale-se de

elementos do pensamento ocidental, para fundamentar

sua resistência.

Para isso, insere o budismo de seu país na históri

a geral das transformações do

budismo e, nota, que apesar, das circunstâncias his

tóricas, o Japão manteve fidelidade a

ele. A experiência do Zen budismo é a do budismo Ma

hayana e o seu desenvolvimento

histórico se processou no povo chinês cuja psicolog

ia ou mentalidade, observa, difere

enormemente do pensamento indiano, de onde o budism

o provinha. Avalia que era uma

contribuição do gênio chinês para a história da cul

tura de modo geral. Graças aos

japoneses, o espírito do Zen foi conservado e sua t

écnica completou-se (Suzuki, 1978,

129). Essa é uma das teses mais queridas de Suzuki:

o Zen é a maneira chinesa de aplicar

a Doutrina da Iluminação budista indiana à vida prá

tica. Ela é repetida, inúmeras vezes,

no decorrer de sua obra. Ela se alicerça na premiss

a de diferença cultural entre chineses e

indianos, sendo os primeiros práticos, moralistas e

com mentalidade histórica, enquanto

os segundos seriam metafísicos, transcendentais e e

stariam acima das coisas mundanas

(Suzuki, 1961, 24).

O processo que resultou no Zen chinês é um complex

o cultural (Idem, 27). O

budismo levou, além de suas práticas, a sua literat

ura que necessitava ser traduzida e que

era fruto das grandes tendências Hinayana e Mahayan

a. Depois das traduções passou-se

na China para outra região de conhecimentos (Suzuki

, 1965, 135-7), a etapa de

aprofundamento espiritual. Em síntese, a história d

o budismo Zen na China seria

constituída pela história de seus líderes budistas

e de seus dramas espirituais marcada

pela transposição cultural do budismo da Índia. As

crenças foram mantidas em novas

práticas.

Suzuki alerta que não pretende realizar um estudo

crítico e científico da história

do budismo Zen. Objetiva colocar o leitor a par da

história tradicional do Zen tal como

contada por seus seguidores no Japão e na China (Id

em, 209). Remetendo, para suprir

lacunas históricas, às grandes linhas gerais da his

tória da própria religião. Deste modo,

procura o elo lógico entre a doutrina Mahayana da I

luminação na Índia, e sua prática

buscada pelos chineses no cotidiano (Suzuki, 1965,

238 e 240).

Realizando a leitura minuciosa de fontes tradicion

ais, complementada pela crítica

erudita, inclusive percebendo as mudanças das palav

ras e conceitos utilizados por seus

autores, Suzuki constrói uma história "moderna" par

a o Zen e re-examina a história dos

patriarcas Zen na China, de Bodhidharma a Hui-neng,

o sexto, ao qual dedica um estudo

particular (1989). Com isto percebe as transformaçõ

es do Zen na China, e o predomínio

de determinadas orientações sobre outras, dando a c

onfiguração atual ao Zen japonês.

Com sua maneira peculiar, Suzuki escreve a históri

a do Zen budismo, não se

preocupando com precisões de ordem cronológica ou s

istemática, mas traçando uma

história extremamente coerente, das transformações

internas ocorridas no Zen e

descrevendo instituições (1961, 107)

.

Examina uma série de casos pessoais de realização

espiritual, onde seus atores empregavam conheciment

os intelectuais e vontade. E nota a

que a história do Zen seria marcada pela tendência

de obscurecer a experiência do

cotidiano e transformá-la em reflexiva. Com isto, d

e um lado, nasceria a obtenção

artificial daquilo que os mestres primordiais produ

ziam de maneira espontânea, mas, por

outro lado, o Zen alcançaria uma quantidade maior d

e pessoas.

As intencionalidades

Esta construção da história do budismo Zen por D. T

. Suzuki, se insere em duas

intencionalidades: uma, a reforma do budismo o japo

nês e, a outra, a comunicação do

budismo aos ocidentais em categorias e num discurso

que lhe fossem familiares.

A premissa básica é considerar o budismo como funda

mento da própria cultura

japonesa (Suzuki, 1958,viii). Num texto de 1930, S

uzuki analisa as fases históricas do

budismo japonês, buscando seus valores, desde os se

us primórdios (Suzuki, 1957, 1352).

Do século XII ao século XIX, foram séculos de paz,

sem estímulos, as organizações

tornaram-se poderosas, a hierarquia eclesiástica to

rnou-se mais refinada e mais

complicada, as autoridades tradicionais eram mais a

ristocráticas, a fé e a devoção mais

formais e a especulação se petrificou, perdendo o b

udismo sua vitalidade (Suzuki, 1957,

1362).

No período da segunda metade do século XIX até 19

30, os budistas sairiam da

letargia, quando desmoronou o feudalismo, o xintoís

mo recobrou forças pela intervenção

oficial, ocorreu uma perseguição atenuada ao budism

o e as subvenções das autoridades

locais ou centrais foram suprimidas. Em meio século

mudou a situação. Houve estímulo e

revitalização sustentada pela qualidade permanente

do budismo, força poderosa que

alimentou os japoneses, enquanto nação e como indiv

íduos. Sem ele, o Japão não poderia

ter o seu estado atual de cultura e de iluminação,

pois deixou uma impressão permanente

sobre as artes, os costumes e a cultura (Idem, 1362

-4).

Suzuki, ao identificar o budismo como fonte viva de

orientação do povo japonês,

via nisto o argumento para pressionar os líderes bu

distas japoneses a uma modernização

de sua religião. Para tanto, se apóia em dois instr

umentos: o modelo do universo religioso

chinês a ser refletido pelos seus conterrâneos e le

var a mensagem budista aos estrangeiros.

Se estes se interessavam é porque havia no budismo

japonês algo de valor que devia ser

preservado.

Tanto quanto a utilização de categorias de pensamen

to originadas no ocidente, o

pensador japonês tem para si uma espécie de missão

de divulgar o budismo japonês no

Ocidente. Isso aparece em vários de seus livros, es

critos em momentos diferentes. O seu

texto mais popular,

Introdução ao zen budismo

, são artigos publicados no Japão durante a

guerra de 1914 e que em 1934 foram transformados nu

m livro (1963, 3). Em 1950,

confessa, num texto, que seus encontros, com jovens

americanos e ingleses, fizeram que

reestudasse sua compreensão do Zen e a expusesse nu

m novo discurso (1977, 11).

Estas duas intenções se lastreiam numa concepção am

pla do budismo. Suzuki

afirma que o budismo é originalmente democrático e

prático (1958,1357). Isto pode ser

entendido também como uma crítica ao budismo japonê

s de então ser extremamente

voltado para si mesmo. A democratização não era só

para o budismo, mas acompanharia

a sociedade inteira (1971, 96). Lembremos que, até

falecer Suzuki, predominava a

Guerra Fria. Neste contexto histórico, propugna que

o Budismo permitiria o diálogo

Ocidente-Oriente, (Suzuki, 1957, 1363-4) criando um

espírito de tolerância (Suzuki,

1968,86).

Daisetz Teitaro Suzuki não expôs um budismo estrita

mente acadêmico e erudito,

ou mesmo, um budismo de uma só escola, mas pretendi

a mostrar um budismo abrangente.

Lembro que Suzuki poucas vezes em seus escritos tra

ta da meditação Zen, nem a

descreve, nem aponta os textos japoneses onde estej

a contida. Isto dava à sua visão do

budismo um caráter peculiar e distante do que era e

nsinado pelos templos e mosteiros.

Sem dúvida, estava também relacionada com as transf

ormações do budismo japonês

contemporâneo. Isso transparece na sua compreensão

da história. O historiador chinês Hu

Shih (1961, 2-30), discordou de Suzuki sobre o pape

l histórico do Zen na China.

Considerava que o Zen era uma revolta contra o budi

smo indiano, estrangeiro e estranho

à China, enquanto que Suzuki via o Zen como a forma

a mais eficiente, de assimilação do

budismo pelos chineses (Suzuki, 1956, 135).

A polêmica retratava a oposição de duas maneiras d

e compreensão da experiência

religiosa. Suzuki propugna uma experiência Zen, des

vestida de toda a nomenclatura

advinda das instituições budistas e despojada da li

nguagem tradicional oriental,

compondo como que o centro de toda experiência reli

giosa autêntica. Aqui estaria o

critério básico para compreender o budismo, o crist

ianismo e as demais religiões. Daí seu

interesse em estudar Eckkart (1976), ou o seu diálo

go com Thomas Merton (1972, 93-

127). A isto se opunha Hu Shih que considerava o Ze

n como um produto puramente

histórico (Hu Shih, 1961, 136).

Finalmente, Suzuki considera a compreensão históric

a - mesmo crítica -, como

provisória; só a experiência religiosa seria defini

tiva. Isto o faz retornar ao budismo como

religião, retornar à sua tradição religiosa (Suzuki

, 1965, 61).

É provável que a pretensão de universalidade expost

o nos escritos de Suzuki sobre

o Zen tenha sido um dos motivos de seu sucesso jun

to aos seus leitores ocidentais. Sua

análise histórica deixa de lado fatores econômicos

e, brevemente, toca em aspectos

políticos e sociais do Oriente. Afinal, ele mesmo c

onfessara não querer ser um historiador,

mas não deixa de lançar mão da história, num verdad

eiro paradoxo porque pretendendo

seus escritos ser universais sua leitura revela sua

particularidade.




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